O
poder do ódio
Ódio é uma forte reação emocional
que brota diante do amor frustrado. Sente-se ódio ao lembrar-se dos abusos
sofridos na infância por adultos que nos deveriam amar e proteger. O ódio age
como uma defesa contra a dor diante da perda de algo importante, alguém ou um
ideal pelo qual nos apaixonamos. Odiar é parte importante do processo de luto.
Odiamos quando percebemos que nos deixamos enganar pelo vendedor de sonhos
impossíveis. Tal vendedor pode ser um líder político ou religioso, um
professor, um guru, uma mulher ou homem que nos promete apaixonadas realizações
de desejos que nos livram da responsabilidade de promover nossa própria
felicidade. Pelo contrário, esses vendedores de sonhos tiram de nós o que não
queremos dar: nossas próprias ilusões! O mais difícil do processo de elaboração
das perdas é aceitar o autoengano por trás do desejo frustrado. Depositamos no
outro toda fé e esperança enganosa e por ela lutamos até a morte.
Odiaremos enquanto não aceitarmos
que somos os autores da falácia. Sem essa autocrítica, ninguém supera a dor e o
medo da repetição. Portanto, se a ilusão ainda não se desfez, aceite seu ódio. Mas
não destrua pessoas ou objetos materiais. Tais pessoas ou coisas foram agentes
do fabricante de ilusões que mora dentro de cada um de nós. É esse fabricante
que nos coloca na posição de dependência, de discípulo, de seguidor, de
submissão a um salvador qualquer. Muitos se dizem apoiadores de uma igreja,
partido político ou líder, mas não enxergam que estão se apoiando neles quando
não conseguem se sustentar em si próprios. Neste caos, não odeie o mensageiro.
Não procure culpados da sua imaturidade e negativa em enxergar a realidade. Pelo
contrário, busque em si mesmo as causas da sua dor.
Odeie até compreender que o que
precisa ser destruído é a sua tendência a crer que a tal da esperança
direcionada para o outro está corroendo a sua capacidade de transformar sua
vida, dando-lhe sentido e dignidade. Odeie até poder reconhecer suas tendências
infantis a crer em falsos profetas que prometem um paraíso que irá
poupar-lhe do trabalho de se tornar você mesmo e realizar seus talentos e
capacidades.
Seu ódio vai deixar de se
manifestar como depressão quando você aceitar que o criador de ilusões que mora
em você está lhe culpando e atacando pelo fracasso de suas idealizações.
Enfraquecidos pela esperança
depositada no outro, nos tornamos cegos para nós mesmos, negando aquilo que
verdadeiramente pode nos trazer paz, amor e realizações significativas. Seu
ódio vai passar quando você aceitar o amor por si mesmo e pelas causas que
cultivam a vida viva em vez de se apoiar na crença em um mundo ideal. O
processo civilizatório é lento.
Seu ódio vai durar enquanto você
continuar acreditando que os inimigos estão fora de você e devem ser
combatidos. Não nos tornamos melhores por aquilo que criticamos, condenamos e
afastamos. Melhoramos quando lutamos por aquilo que agregamos enquanto valor.
Seu ódio vai durar enquanto você
não aprender a separar emoção de ação. Emoções são dinâmicas. Duram um certo
tempo e depois acabam. Ações têm consequências que precisam ser avaliadas. A
sabedoria vem quando deixamos de transformar qualquer paixão frustrada em ação
destrutiva. As emoções não podem ser evitadas, mas podem ser tratadas, cuidadas,
até amadas. Já as ações podem ter consequências irreparáveis.
O ódio tem o poder de destruir,
mas, se formos inteligentes e cuidadosos, o tomaremos como uma fonte de energia
para enfrentar a verdadeira origem do sofrimento que vem das ilusões e da
esperança de viver num mundo ideal, que quer
nos poupar de sermos responsáveis pelo nosso crescimento e superação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário