domingo, 1 de maio de 2022

O ganho que a perda nos traz.

 Geralmente abordamos nossos conflitos a partir do sofrimento e nos perdemos das capacidades que nos diferenciam das partes em conflito. Quando isso ocorre há uma tendência a se anular o 'si mesmo' e se tornar uma presa das crenças e dos Estados de Ego emocionalmente disfuncionais, formados a partir dos restos emocionais das experiências traumáticas de perda, agressão, abandono, etc.

Depressão e ansiedade não são um destino a não ser que nos deixemos levar por essa falta de sentido de si mesmo que estava oculta enquanto o eu se inflava orgulhoso, pelo contexto, por aquilo que vinha dos outros, como elogios, amor, reconhecimento profissional,... pela falsa sensação de segurança absoluta obtida pelo ideal de superioridade. Parece que a maior capacidade do 'eu ideal' é difundir a ilusão de que o 'si mesmo' é mais do que realmente é. E é essa ilusão que faz pensar que a cura da perda será obtida pelo retorno da mesma condição, o que só alimenta a repetição neurótica.
O processo terapêutico adequado, ou a forma adequada de elaboração, é a que ajuda ao 'si mesmo' a assumir a liderança separando o passado do presente, o imaginário do que é real, o interno do que é externo e a realizar o discernimento entre o eu engrandecido, que se definiu a partir do desejo do outro, feliz enquanto era escravizado, daquele que se realiza pelo próprio desejo, ou pelas próprias capacidades.
Nesse si mesmo esclarecido, desiludido, redimensionado pela humildade, (que tendemos a evitar pois o 'eu ideal' tende  a interpretar como inferioridade, mas que na verdade é a função que nos permite ver as coisas como são e não como gostaríamos que fossem), pode então prevalecer o amor próprio como suporte da dignidade que sustenta o amor pelo outro, como um transbordamento e não como uma dependência ou um remendo da autoestima. Esse si mesmo esclarecido, se revela depois que o luto o libera; não exclusivamente do objeto perdido, mas principalmente, do fracasso do eu autoengrandecido. Uma ilusão de superioridade através da qual o 'si mesmo' se definia.
O sofrimento pela perda de um amor ou de um lugar de importância requer um processo de luto que se dá diferenciando o objeto perdido da ferida narcísica aberta,  à qual tendemos a dar mais importância.
É desse si mesmo libertado das suas ilusões que descobrimos que o prazer de amar é maior do que o de ser amado. Que importa mais dar sentido à vida do que esperar que o sentido venha dos outros. 
Esse é o ganho que a perda nos dá.