sábado, 23 de março de 2019

A função da ternura

Sexo e agressividade muitas vezes se combinam. Chegam ao extremo do sadomasoquismo que a muitos convém. Casais se mantêm unidos pela administração conjunta destes dois fatores. Alternar uma boa briga com uma noite de sexo ardente não é raro. Para outros o sexo esfria quando a agressividade diminui.  No entanto, o amor se combina melhor com a ternura do que com a agressividade enquanto força propulsora.  Paixão, sexo e agressividade podem evoluir para amor e ternura, desde que a agressividade não se transforme em agressão. A agressão é antagônica da ternura. Mais ainda quando alguma forma patológica de agressão se impõe. Quando o amor acaba num relacionamento pode ser também porque a relação adoeceu pela falta da ternura. A ternura é uma sensação sutil que se integra à consciência do eu e age como um protetor do amor. No amor a vibração energética é mais forte e pode ir além do objeto amado, pois é expansionista. A agressividade com ternura pode levar ao sexo intenso: "Ah, se eu te pego!" Que é a vibração mais potente da capacidade de união através de outro corpo sensível. A ternura em si, mesmo sem ser dirigida ao outro, envolve todo o corpo em ondas sutís de amor e bem estar que dissolvem a dor e a raiva. A agressão ao outro, e também a si mesmo, vem do "eu ferido" cujo  medo ergue suas "barreiras de contato" como defesa nutrindo o "caráter neurótico", que é aquele que se preserva através do imaginário desprovido de autocrítica, pois não vê a si mesmo enquanto narcisista e não vê o outro na sua alteridade mas somente suas projeções, às quais reage agressivamente. O caráter neurótico sofre de uma vergonha profunda do que lhe falta porque se orgulha da sua autoimagem forjada no reino da onipotência infantil. Mas, teme ser desmascarado diante de sua pretensão fracassada, pois a "vergonha patológica" o domina. Enquanto a vergonha, a agressão e o medo lutam para manter o equilíbrio de um sistema neurótico, a ternura vai se retirando aos poucos deixando o amor desnutrido e fraco. Quando o eu admite o limite do seu alcance, a percepção de que algo lhe falta se tornará uma força motriz da busca de crescimento e superação como um ato de amor a si próprio sustentado pela ternura, que age como um porto seguro que restaura e abastece. Novas aquisições (ao eu) poderão surgir. Mas, quando o eu se vê pressionado por um juiz interno muito severo que mede suas ações com a régua da imagem do "eu ideal" (infalível) a agressão pretensiosa tende a prevalecer sobre a ternura, gerando mais exigências perfeccionistas e menos satisfações realistas. Prisioneiros deste ciclo vicioso vivem sem amor próprio, se enfurecem e se entristecem em lugar de se acolherem. A.Ricardo Teixeira

sexta-feira, 8 de março de 2019

Heal O poder da mente: uma breve análise

Assisti "Heal o poder da mente" e gostaria de fazer algumas observações. Inicialmente, o filme expõe as fragilidades da medicina (oficial), que se propõe baseada em evidências, mas que muitas vezes, fechou os olhos para evidências que apontam para outras direções tais como o efeito placebo, as curas espirituais e a chamada remissão espontânea da doença. Podemos facilmente evocar teorias conspiratórias por parte dos interesses econômicos da indústria farmacêutica e dos médicos interessados em vender seus tratamentos como produtos validados cientificamente. Tudo isso cabe na discussão porém, não podemos esgotar o assunto aí pois há muitos outros detalhes em jogo. 
Embora não tenha resposta para todas as perguntas fundamentais pertinentes sobre as  causas das doenças  e melhores  tratamentos,  o filme põe em evidência o estresse crônico e os traumas inconscientes, a genética e o estilo de vida, como já sabemos. Apresenta como opção as  mudanças no estilo de vida enfatizando alimentação saudável, controle do estresse, atividade física, meditação, yoga, acupuntura, terapias alternativas, etc. (Para muitas pessoas, isso equivale a uma conversão da ignorância sobre si mesmo  para a sabedoria).  
O que  me incomodou no filme é que essas práticas foram apresentadas como se bastasse que elas fossem praticadas que a cura viria como efeito. Acontece que há vários casos de meditadores que morreram de  câncer, professores de yoga que tiveram surtos psicóticos, terapeutas que se suicidaram por depressão, atletas que adoeceram, etc. Certamente, isso não torna essas práticas inúteis nem ineficazes. Pelo contrário, o que precisamos é considerar desde quê posição psíquica elas são tomadas. 
O poder da mente  onipotente e  dissociada pode causar uma grande confusão neste cenário clínico colocando as práticas alternativas no mesmo plano das outras gerando uma disputa do mercado das doenças. Retiros espirituais, alimentação saudável e meditação, a despeito dos benefícios, podem ser também uma grande forma de fugir de si mesmo. Ou nutrir rigidez caracterologica, dissociação  e obsessões. Terapias podem aperfeiçoar o caráter neurótico em vez de dar-lhe  flexibilidade e aceitação da falibilidade humana. O certo é que estamos em rota de colisão com a morte e a encontraremos sem termos resolvido muita coisa sobre a existência uma vez que ignorância e a onipotência  impedem de problematizar. 
Um processo de cura de doenças crônicas causadas por trauma e por estresse pode ocorrer quando emergem à consciência  todos os elementos envolvidos na experiência traumática. São eles: significados autorreferentes, (geralmente julgamentos autodepreciativos); sentimentos ligados ao isolamento emocional, abandono, rejeição, culpa, vergonha, ciúmes, inveja, que são os mais difíceis de reconhecer, inferioridade e superioridade compensatória, angústia,  etc. ; emoções básicas (medo, raiva, tristeza, nojo, alegria), geralmente bloqueadas na memória traumática; sensações corporais correspondentes ao evento traumático, associadas às intensas ativações neurofisiologicas causadas pela percepção de ameaça. 
Ativar os mecanismos naturais de cura implica em superar vários mecanismos de defesa do ego para poder entrar em contato com a devastação causada pelo trauma através da confiança e do  suporte terapêutico pois, à sós é muito difícil. O paciente precisa  combinar a coragem de enfrentamento ao apoio recebido, a humildade à compaixão por si mesmo e a técnica apropriada a uma forte intenção de se curar. Ninguém consegue alcançar uma resposta terapêutica tão profunda se ainda estiver dominado pelo pensamento mágico ou por defesas dissociativas.